sábado, 10 de maio de 2008

Menina branca como a neve - o caso Isabella

Quando você for-se embora
Moça branca como a neve
Me leve, me leve

Se acaso você não possa
Me carregar pela mão
Menina branca de neve
Me leve no coração

Se no coração não possa por acaso me levar
Moça de sonho e de neve
Me leve no seu lembrar

E se aí também não possa
Por tanta coisa que leve
Já viva em seu pensamento
Moça branca como a neve
Me leve no esquecimento
(Me leve - Ferreira Gullar)





Quem de nós, na infância, não ouviu atentamente a estória da Branca de Neve? Qual de nós não reconstruiu, na própria imaginação, a figura da madrasta má que, invejando a beleza de enteada, mostrou-se capaz de atitudes nada nobres para uma rainha.

Pois era com essa madrasta que nossos filhos, sobrinhos, pais e mesmo nossos avós, conviveram até a noite do dia 29 de março de 2008, quando Isabella, a menina branca como a neve, foi assassinada.

Depois do "caso Isabella", como ficou conhecido, a madrasta da Branca de Neve foi redimida de suas maldades e recobra urgentemente, em nossa fantasia, o posto do qual foi destronada, afinal suas perversidades tornaram-se "café pequeno" diante das atrocidades cometidas contra a pequena Isabella. Nosso imaginário se viu fragilizado demais tamanha overdose de crueldade real a que fomos expostos.

Deu saudade do caçador servil que fraquejou, na hora "h", dar cabo da jovem princesa, alertando-a a fugir em busca de um lugar seguro. Mais saudade ainda da maçã envenenada, que só de olhá-la nos fazia salivar. Sutilezas da perversão...

Isabella não experimentou um feitiço, passível de ser quebrado por um ato de amor, encarnado na estória infantil pelo beijo apaixonado do príncipe ou, quem dera, na vida real, pelo gesto amoroso do pai em socorrê-la. Não houve feitiço algum, mas uma espécie de mágica pelo avesso, impossível de ser desfeita: a morte.

Na estória, é a madrasta que, encurralada pelos anões, despenca no precipício após escorregar de uma montanha muito alta. É o ápice de nossa sede desesperada por justiça.

Por que a vida não imita a arte?

Isabella, sem chance de defesa, foi lançada num ato desumano, para não dizer inclassificável, do sexto andar de um edifício, ao que tudo indica pelas mãos do próprio pai - o espelho da madrasta?!

Naquela noite, os anões, em menor número e tão indefesos quanto, nada puderam fazer.

Enquanto seu corpo estendido na pequena área reservada ao jardim - seria sua floresta? - desfalecia, nascia em cada um de nós a perplexidade e o desejo íntimo e inútil de que esta, sim, não fosse uma estória real.
(VaneideDelmiro)




Queremos o seguinte no jornal
Quem mata menina se dá mal
Sendo gente bem ou marginal
Quem fere uma irmã tem seu final
(Mônica - Composição: Angela Rô Rô)

5 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns, pelo paralelo que fez onde todos os personagens da Branca de Neve, tiveram seus correspondente no "caso Isabella". Só uma pessoa com muita sensibilidade, criatividade e o saber lidar com as palavras consegueria. Infelizmente a inveja da "bella" ainda esconde muitos sentimentos ...

Unknown disse...

Nossa! sempre soube que tinha talento, mas essa ultima postagem do caso isabela superou todas minhas expectativas. Fico muito orgulhosa como irma e tambem como leitura... vc e impar como sempre! beijos

Anônimo disse...

A sutileza como vc compõem as palavras, tira do horror de uma cena absurda, as letras q muitos gostariam q ñ fosse verdade, descreve com sensibilidade a dor de quem esteve, ñ esteve e ñ desejaria esta la! Otimo, adoro lê e reler o q escreves, de um encanto...

Anônimo disse...

essa não é uma composição do Fagner, e sim um poema do Ferreira Güllar musicado por ele!

VaneideDelmiro disse...

Valeu, Gabriel, pela informação. Farei a correção. Obrigada!!!