quinta-feira, 3 de julho de 2008

"Porque o poeta é irmão do escondido das gentes..."

"E também é verdade que um escritor enquanto ser humano fica absorvido demais em tentar compreender a si mesmo e ao outro, e não suficientemente mestre do resto de sua vida. Hoje estou menos explícita, mas quem sabe se alguém vai entender o que pretendi dizer através deste meu poema:


Tudo vive em mim. Tudo se estranha
Na minha tumultuada vida. E porisso
Não te enganes, homem, meu irmão,
Quando dizes na noite, que só a mim me vejo.
Vendo-me a mim, a ti. E a esses que passam
Nas manhãs, carregados de medo, de pobreza,
O olhar agudo, todos eles em mim.
Porque o poeta é o irmão do escondido das gentes
Descobre além da aparência, é antes de tudo
LIVRE, e porisso conhece. Quando o poeta fala
Fala do seu quarto, não fala do palanque,
Não está no comício, não deseja riqueza
Não barganha, sabe que o ouro é sangue
Tem olhos no espírito do homem
No possível infinito. Sabe de cada um
A própria fome. E porque é assim, eu te peço:
Escuta-me. Olha-me. Enquanto vive um poeta
O homem está vivo."


(Hilda Hilst - Paixões e Máscaras, do livro: Cacos & Carícias & Outras Crônicas, 2007)

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