domingo, 6 de abril de 2008

Há coisas que amarelam (e pessoas também!)

Pintura: Salvador Dali



Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amarelecida,
Rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria...
Eu tenho um medo horrível
A essas marés montantes do passado,
Com suas quilhas afundadas, com
Meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e gáveas...
Ai de mim,
Ai de ti, ó velho mar profundo
Eu venho sempre à tona de todos os naufrágios!
(Mário Quintana)




Um sorriso amarela quando ficamos sem jeito, mesmo se os dentes são branquíssimos. Na hora h se amarela e se perde uma oportunidade há muito esperada. A verdade e a transperência podem causam uma amarelidão sem fim. Diante da pessoa amada, então, amarela-se muito, quase uma hepatite sentimental.

Amarela-se por medo, por conveniência, por prudência, por falta de iniciativa, por insegurança e por tantas outras razões.

Algumas lembranças vão se esmaecendo com o correr dos anos. Quem sabe um jeito sutil de amarelarem... Os papéis também amarelam com a tinta do tempo. Guardados ou esquecidos, em gavetas de madeira ou da memória, amarelam cartas, poemas, declarações, confidências, pedaços de si... Seriam estas as “marés montantes do passado”, as quais temia horrivelmente Mário Quintana?

Hoje, assim como ele, encontrei uma carta amarelecida. Embora temendo, não a rasguei. Quer dizer é uma carta duplamente amarelecida, porque amarelei na hora de enviá-la e continuo amarelando até agora.

Relendo-a tive a sensação de que mesmo os acontecimentos e afetos perdendo o tom original, algo do seu vigor conservar-se apesar de tudo. Sem dúvida, Quintana, isso mete medo.



"Todo mundo amarela uma hora" - Fernando Anitelli

2 comentários:

Mari Monici disse...

Isso me lembrou o "amarelo síndico" do Meu amigo pintor.
E vamos amarelando mesmo...com 30 então, nem se fala! rs
Claro que estás 'incluídissima' no meu post sobre os amigos. Um abraço

Mari Monici disse...

Andas tão sumida....
Ando pelas tampas por aqui...
beijo