Tempo Rei!
Oh Tempo Rei!
Oh Tempo Rei!
Transformai
As velhas formas do viver
Ensinai-me
Oh Pai!
O que eu, ainda não sei
Mãe Senhora do Perpétuo
Socorrei!...
(Gilberto Gil / Tempo Rei)
Esquecida do ano novo e da celeridade de um janeiro quase ido, seus sentidos se voltavam, tão somente, para a brisa festiva daquela manhã, lhe saldando através da janela do ônibus.
A uma altura do caminho, o encontro céu-mar confundia-se num azul-cumplicidade. Momentos raros nos quais se deixava ir, sem indagar como, onde, por que...
Seguia em puro silêncio, numa harmonia gritante, quando um colega a cumprimentou, sentando-se ao seu lado.
Ali iniciaram uma conversa despretensiosa sobre a beleza do dia, o escaldante verão, o tempo decorrido desde a última vez que se encontraram – também no ônibus –, ambos a caminho do trabalho.
O destino final se aproximava, adiantou-se temendo perder a parada. Despediu-se do colega desejando reencontrá-lo para mais uma itinerante conversa matinal.
Nada fora do script. Tudo sob controle, supôs, até ser surpreendida por uma desconcertante e inesperada pergunta: – "E então, quais seus planos para 2009?"
Como pôde? Foi seu primeiro pensamento. Se já era difícil admitir intimamente a escassez de sonhos, a ausência de projetos, a incapacidade de idealizá-los, imagina fazê-lo publicamente, diante da curiosidade dos olhares de outros passageiros. Reabriu-se a Inquisição.
Tentando livrar-se do embaraço a que repentinamente se viu envolta, ensaiou uma resposta qualquer, a única possível na ocasião:
– "Bem", (quando se começa uma frase assim significa, no mínimo, que não há nada bem), "não fiz planos, não pensei a respeito, quis fazer diferente..." Que vexame! Que viagem!
E tão vacilante quanto a sua resposta foram os seus passos em direção a saída. A porta do ônibus se fechou. Atrás de si, todos os olhares, inclassificáveis. Adiante, um futuro não planejado, incerto talvez. Sob sua cabeça, um azul incrivelmente desbotado.
A pergunta repercutiu ao longo dos dias. Agora, era ela quem se perguntava por que não fora capaz de responder que seu projeto consistia simplesmente em VIVER. Parecia-lhe uma resposta razoável, original, inteligente, e em parte verdadeira. Mas por que não lhe ocorreu?
Ao longo dos dias compreendeu sua incapacidade, porque VIVER não é simplesmente, mas bem que poderia, desejava. E em seu desejo a verdade era inteira.
(VaneideDelmiro)
"Acho espantoso viver, acumular memórias, afetos..."
(Caio Fernando Abreu)
"Não se preocupe em entender. Viver ultrapassa todo entendimento"
(Clarice Lispector)
sábado, 31 de janeiro de 2009
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4 comentários:
"Vagamente pensava de muito longe e sem palavras o seguinte: já que sou, o jeito é ser." - Clarice Lispector
Toda vez que me perguntam "como vai" eu me pego pensando no que responder. Normalmente opto pelo "bem", mas não porque eu não tenha mais o que dizer, mas porque não sei se a pessoa aguentaria o peso da minha resposta...
Bjs!
o tempo é o desafio da vida... que seja um fevereiro com resquícios do começar que sentimos em janeiro... bjo
"E em seu desejo a verdade era inteira."
No desejo é sempre assim.
E eu adoro Caio com todas as minhas forças.
E obrigada pela visita! :)
UFA! para o começo de ano, esse texto é de mexer com nosso interior. O que são planos se não SONHOS q pretendemos realizar... O problema é cadê os SONHOS? Como realizar uma coisa se estamos vazios.
Parabéns! achei belooooooo
Marcelo Cavalcanti
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